domingo, 31 de maio de 2015

EQUÍVOCOS VERDADEIROS

ou Verdades sufocadas.

Escrevi isso hoje de manhã cedo,

Devemos fazer protestos, passeatas manifestações senão todos os dias pelo menos 1 vez por semana, se não fizer nada para acabar com a violência enquanto ela não nos atinge, mais cedo ou mais tarde seremos vítimas da violência também, aí camaradas, será tarde demais para chorar, esbravejar e espernear.

e me lembrei +- assim dessa poesia famosa:

Enquanto eles atacavam o vizinho eu não me importei, não era comigo...

É de 1936, mas é tão atual que parece foi escrito amanhã.

“Alguns equívocos literários

Desinformação quase sempre e às vezes até mesmo má fé têm provocado alguns equívocos na literatura de todos os tempos. Durante algum tempo se disse que Shakespeare nunca existiu e que a obra a ele atribuída era na verdade de Francis Bacon. Nunca houve um Homero, a Bíblia foi reescrita pelos apóstolos, Heródoto não foi um, mas vários historiadores. Confusões que foram talvez esclarecidas mas outras acabam por ser aceitas como verdades.

Aqui, Silvana Guimarães e José Nêumanne Pinto denunciam três equívocos recentes que estão quase se transformando em verdades, com a ajuda da internet. Envolvem três poemas: um que não é de Brecht, outro que não é de Borges e um terceiro que não é de Garcia Marques.

Seguem-se um bilhete de Silvana e um artigo de Nêumanne Pinto:

Caro Celso

Estou chegando de viagem, voltando de férias longe, em NY. Mas, botando a vida em dia, fui conferir as novidades de 'Uma Coisa E Outra', acabei achando lá um dos equívocos poéticos mais antigos de que se tem notícia na poesia brasileira.

Veja como está:

A caminho com Maiakovski

(Bertolt Brecht)

Na primeira noite, eles se aproximam e roubam uma flor do nosso jardim: não dizemos nada. Na segunda, já não se escondem. Pisam as flores, matam o nosso cão e não dizemos nada. Até que um dia o mais frágil deles entra sozinho em nossa casa, rouba-nos a luz e, conhecendo o nosso medo, arranca-nos a voz da garganta. E já não podemos dizer nada.

Veja como é:

NO CAMINHO, COM MAIAKÓVSKI

Assim como a criança humildemente afaga a imagem do herói, assim me aproximo de ti, Maiakósvki. Não importa o que me possa acontecer por andar ombro a ombro com um poeta soviético. Lendo teus versos, aprendi a ter coragem.

Tu sabes, conheces melhor do que eu a velha história. Na primeira noite eles se aproximam e roubam uma flor do nosso jardim. E não dizemos nada. Na segunda noite, já não se escondem: pisam as flores, matam nosso cão, e não dizemos nada. Até que um dia, o mais frágil deles entra sozinho e nossa casa, rouba-nos a luz e, conhecendo nosso medo, arranca-nos a voz da garganta. E já não podemos dizer nada.

Nos dias que correm a ninguém é dado repousar a cabeça alheia ao terror. Os humildes baixam a cerviz: e nós, que não temos pacto algum com os senhores do mundo, por temor nos calamos. No silêncio de meu quarto a ousadia me afogueia as faces e eu fantasio um levante; mas amanhã, diante do juiz, talvez meus lábios calem a verdade como um foco de germes capaz de me destruir.

Olho ao redor e o que vejo e acabo por repetir são mentiras. Mal sabe a criança dizer mãe e a propaganda lhe destrói a consciência. A mim, quase me arrastam pela gola do paletó à porta do templo e me pedem que aguarde até que a Democracia se digne aparecer no balcão. Mas eu sei, porque não estou amedrontado a ponto de cegar, que ela tem uma espada a lhe espetar as costelas e o riso que nos mostra é uma tênue cortina lançada sobre os arsenais.

Vamos ao campo e não os vemos ao nosso lado, no plantio. Mas no tempo da colheita lá estão e acabam por nos roubar até o último grão de trigo. Dizem-nos que de nós emana o poder mas sempre o temos contra nós. Dizem-nos que é preciso defender nossos lares, mas se nos rebelamos contra a opressão é sobre nós que marcham os soldados.

E por temor eu me calo. Por temor, aceito a condição de falso democrata e rotulo meus gestos com a palavra liberdade, procurando, num sorriso, esconder minha dor diante de meus superiores. Mas dentro de mim, com a potência de um milhão de vozes, o coração grita - MENTIRA!

EDUARDO ALVES DA COSTA

Niterói, RJ, 1936"