sábado, 19 de abril de 2014

MAIS SUBSTITUÍVEL QUE CIMENTO

Incentivo fiscal

A zona franca da cidade livre

O aglomerado provisório, isento de impostos, cresceu tanto que foi impossível tirá-lo do lugar

"A mãe de Brasília" é o apelido do Núcleo Bandeirante, que, na sua gênese, em dezembro de 1956, foi a Cidade Livre. Com residências e lojas erguidas de madeira, telhas metálicas e amianto, de modo a evidenciar sua suposta vocação efêmera, brotou como centro urbano para receber os trabalhadores que construiriam Brasília. Era livre porque, tal qual as zonas francas, não cobrava impostos. Os lotes destinados ao comércio, indústria e serviços foram arrendados pelo prazo máximo de quatro anos. Calculava-se que, ao fim das obras, os moradores voltassem à terra natal ou se transferissem para o Plano Piloto e vizinhança. A ideia original de funcionar como mero almoxarifado do que ocorria ali ao lado, nos andaimes da construção brasiliense, não funcionou.

Ficou tristemente conhecida, entre os moradores, uma frase de Israel Pinheiro, presidente da Novacap: "Em abril de 1960, mando os tratores para esmagar tudo". Eles nunca chegaram, porque, antes de a Brasília do Plano Piloto existir, a Cidade Livre virara uma aglomeração urbana incontornável, ímã de riquezas. A JBS-Friboi, a maior empresa do mundo no setor de carnes, começou a crescer ali, pelas mãos de José Batista Sobrinho, o Zé Mineiro, o pai dos atuais dirigentes da companhia. Em 1957, com apenas cinco funcionários, ela virou fornecedora de carne para as construtoras da capital, cujos operários viviam na Cidade Livre.

Eram mais de 20 000 pessoas. Quando o governo começou a se movimentar de modo a tirá-las do lugar, houve protestos, brigas e manifestações. A ideia era levar a população para as vizinhas Taguatinga ou Gama, ou mesmo para o Plano Piloto. Em 1961, no governo de Jânio Quadros, a pressão popular chegou ao ápice, no Congresso, na forma de lei. Nascia o Núcleo Bandeirante, hoje com mais de 40 000 moradores – uma cidade de vida mais real, a rigor, do que aquela cultivada nas superquadras do Plano Piloto.

(Veja)